Rockabilly Psicotico, garage bands, punk rock, bandas desconhecidas...

domingo, dezembro 16, 2007

Devo - Q: Are We Not Men? A: We Are Devo!


Outro dia, lia os quadrinhos de Harvey Pekar, mais conhecido como o "Anti-Herói Americano". Lendo o prefácio escrito pelo grande Laerte, ficou na cabeça um trecho que dizia o seguinte: "quando a gente assiste às performances atuais do país dos americanos pelo mundo afora, esquece como é rica a cultura que se produz ali, rica e subversiva". E um dos maiores exemplos de subversão está na música - desde o jazz e o blues, que tocavam intensamente e foram os primeiros a experimentar alucinógenos e entorpecentes, passando pelo rock psicodélico, que quebrava as barreiras do senso comum a fundir a música com tendências surrealistas, e também o punk novaiorquino, que por agregar bandas de outras áreas, um tal de Richard Hell deu um nome mais simpático: Blank Generation - a geração em branco, a lacuna a ser preenchida.

E como esse lacuna era preenchida? Segundo as regras do movimento, de qualquer forma. Desde a porradaria ensandecida dos Deads Boys, à obsessão com o rock and roll clássico dos Ramones e The Cramps, passando por grupos mais acessíveis como Television e Blondie, e desembocando em grupos que primavam pelo pouco óbvio, pelo futurista, pelo visionário: grupos como o Talking Heads e a banda que abordamos hoje, o Devo.

Originários da cidade de Akron, estado de Ohio, os rapazes - mais nerds do que junkies, mais excêntricos do que punks - migraram para Nova Iorque ao saber da efervescência musical que dominava o lugar - e o clube CBGB'S como o local ideal para conseguir vender seu peixe. Era impossível a banda não chamar a atenção - no som, no visual, nas capas, a banda desconcertava os que chegavam a conhecê-los.

As capas de disco eram bregas, futuristas ou simplesmente bizarras. O som, inclassificável - punk rock, sintetizadores, dance, pop, livre experimentalismo - e impossível de passar batido pelos ouvidos. E as roupas... Bem, eles não vestem do jeito que alguém sairia na rua. Pirâmides na cabeça, macacões coloridos, jaquetas de couro, sacos plásticos, roupas de freira, chapéus de cowboy, capacetes de astronauta, uniformes de marinheiro, roupas de operários e qualquer coisa que surgisse nessas insanas cabeças. Ou seja: comparando com outras bandas que chocaram em som e imagem, como o Velvet Underground, eles não eram a representação do mais baixo que o ser humano consegue chegar - e sim algo totalmente alienígena. Prova disso é a forma de como o universo descrito pela banda pode ser sintetizado: ficção científica brega, com toques de humor surrealista. Segundo a própria banda, uma 'devolução': o ser humano já atingiu seu ápice e o Devo queria ajudar o máximo que pudesse a chutar a evolução escada abaixo.

Apesar de só estourarem nos anos 80, quando então deixariam a maior parte do seu legado para as bandas de rock alternativo de hoje em dia, a banda foi formada há 35 anos atrás, em 1972, e debutou logo com seu maior clássico, o obrigatório "Q: Are We Not Men? A: We Are Devo!". E o mundo começava a prestar atenção nesses estranhos extraterrestres que brotaram da terra. A banda, até então, era formada por Mark Mothersbaugh no vocal, guitarra e teclados, Gerry Casale no baixo, Bob II nas guitarras e teclados, Bob I nas guitarras principais, e Alan Myers na bateria.

O álbum abre com "Uncontrollable Urge" aproximada do punk novaiorquino com seu riff elétrico e direto. Uma música incansável cheia de 'yeahs' gritados de forma esquizóide em meio a uma letra que fala sobre uma necessidade urgente e imediata de gritar. Da mistura sobreposição de vocais, backing vocals e sons estranhos, a música é uma pancada do início ao fim.

O Devo é dono de um dos covers mais improváveis de todos os tempos: "(I Can't Get No) Satisfaction", dos imortais e chapados Rolling Stones, foi totalmente descontruída e reconstruída ao bel-prazer do Devo. O quanto de choque que a versão deve ter causado na época, eu não sei, mas imagino o choque conservador ao ouvirem uma bateria tribal e um clima soturno, repetitivo e distorcido. A crítica à alienação provocada pela indústria do consumo ganha contornos psicóticos, poucos usuais e para os menos acostumados com inovação, até certo desconforto.

Bateria martelando, guitarras em riffs quadrados e aquele vocal maníaco e aterrador. Esta é "Praying Hands", uma crítica impiedosa contra a religião e as pessoas que acham que contribuem muito para o mundo rezando. A banda soa mais agressiva ainda no verso: "OK, relaxe... Fique na posição... Vamos em uma submissão canina". O sintetizador só ajuda a nos sentirmos mais perdidos do que já estávamos.

"Space Junk" tem até certo charme pop, com agradáveis e repetitivas melodias de sintetizadores, mas contrastando com uma cozinha truculenta e riffs que surgem do nada, calando o sintetizador e mandando o ouvinte para o espaço. O eu-lírico declara estar tão louco por porcaria espacial que nem percebe que a garota com quem nunca tinha falado nem tocado mas considerava sua estava morta com a cabeça esmagada pelo que dá nome à canção.

Um dos maiores clássicos da carreira do Devo, esta é "Mongoloid", carismática canção introduzida pelo baixo e que cresce em ritmo marcial e vira um conto pop elétrico, distorcido e de certos tons épicos. Aqui presenciamos a história de uma pessoa com problemas mentais, em vários versos de humor negro como "Mongolóide, ele era um mongolóide/Mais feliz do que você e eu/Mongolóide, ele era um mongolóide/E isso determinou o que ele podia ver". Permeia por toda canção o irônico fato dele ficar feliz por poder usar chapéus, ir para o trabalho e roubar toucinhos sem ser percebido, enquanto nós, "normais", estarmos sempre deprimidos.

"Jocko Homo" tem um riff elétrico e pausado ora contrastando com o sintetizador dançante, ora com a voz de Mark. A música fala de evolução, com o vocalista declarando que consegue fazer as mesmas coisas que um macaco, e aproxima toda a humanidade dos símios. "Nós não somos homens?", pergunta Mark. "Nós somos o Devo!", responde uma voz doentia.

Seguindo com "Too Much Paranoias" que entra em tom de alerta, com as guitarras sempre beirando a explosão, enquanto o baixo e a bateria golpeiam repetida e maniacamente. Então... A música some! E torna-se um amontoado de sons e vibrações desconexas, apenas para a guitarra e Mark voltarem a se desesperar em uma música de sonoridade e letra neuróticas e desconfiadas com tudo.

"Gut Feeling (Slap Your Mammy)" é outra música que o Devo aproveita para destilar sua ousadia e humor negro, em uma música de cinco minutos introduzida de maneira quase pop, com direito a melodias mais acessíveis comparadas ao resto do álbum. A letra trata sobre vingança, onde o eu-lírico sente vontade de torturar uma pessoa que o oprimia e também agredir seus progenitores. Com o desenrolar, a música vai ficando cada vez mais barulhenta, pesada e intensa, até explodir em um punk rock neurótico.

E não pára por aí. "Come Back Jonee" segue a estratégia conhecida da banda de introduzir o ouvinte em uma tropical floresta pop... E fazer com que ele entre sem perceber em um pântano de esquisitices e detalhes exóticos - mesmo essa sendo uma das mais "normais" do álbum, digamos que soa como se os Beach Boys fossem viciados em anfetaminas e tivessem passado a juventude no Queens. A música parece dar uma bronca no tal Jonee do título, um garoto egoísta que só pensa em seus próprios interesses e faz com que uma garota fique deprimida.

"Sloppy (I Saw My Baby Gettin')" parece inverter a situação, e pior ainda: a garota do eu-lírico compra um carro e parece ir embora. A bateria soa crua e seca, as guitarras inflamam-se, Mark canta mais psicoticamente ainda... E então a música se desmancha em acordes e ruídos perdidos no ar, para então eletrocutar o ouvinte novamente.

A última música recebe o nome de "Shrivel-Up" tem um groove soturno impossível de passar despercebido, além de sons de sintetizadores delirantes que dão um ar atmosférico e pouco usual na canção. As várias reviravoltas são sempre acompanhadas com estranhezas, criticando alguém que toma cuidado com tudo, vive do jeito certo, não se diverte nem um pouco e torna-se uma pessoa pequena.

Mesmo quase todas as bandas da blank generation sendo brilhantes, ainda praticavam um som, digamos, que se tornou padrão para a segunda metade dos anos 70. Já o Devo... Ainda parece atual mesmo 29 anos depois de debutar e trinta e cinco anos depois de surgir. Muitas bandas que tocam rock alternativo hoje simplesmente devem os dedos com que tocam à uma das bandas mais diferentes surgidas na história da música pop do século vinte. Os diferenciais, creio eu, já foram-lhe muito bem apresentados.

Mas esteja avisado: quem entra nesse universo, deixa de ser humano. Passa a ser um... Devo!

Jeff Buckley - Grace


Trocando em miúdos: Jeff Buckley foi um caso raro na história do Rock And Roll. Tal como uma chama, brilhou por um breve tempo e então apagou. Sem querer forçar a barra, mas era dor transcendendo a música, eram tantas emoções guardadas que pareciam não caber nos acordes ou nos emocionados cantos e gritos.

Nascido na Califórnia e filho do músico de folk-jazz Tim Buckley, Jeff cresceu até os oito anos sendo chamado de Scotty Moorhead, nome que foi dado pela sua mãe e seu padrasto. Quando alcançou a idade em questão, a mãe o levou para ver um show de Tim, e acabou passando uma semana com o pai. Quando voltou, queria ser tratado como Jeff Buckley. Pouco após essa semana, o homem que deu vida a Jeff morria de overdose de heroína. Além de ter muito do pai, o garoto também aprendeu música com a mãe, pianista e violoncelista e começou a despertar curiosidade pelo Rock com seu padrasto, fã declarado de Led Zeppelin, Jimi Hendrix e The Who. Adolescente, apaixonou-se pelo álbum "Physical Graffiti" do Led Zeppelin e discos do Van Morrison, Janis Joplin, MC5 e The Smiths, pegou para si uma guitarra acústica da avó e pouco após ganhou uma Gibson Les Paul de sua mãe. Aos dezoito, ingressa num curso de dois anos numa instituição de músicos. Apesar de considerar o curso uma perda de tempo, nesse período conheceu e tornou-se fã de ícones musicais como Leonard Cohen, Nusrat Fateh Ali Khan e Edith Piaf.

Apesar da semelhança física e um nível de talento proporcional ao do pai, Jeff não queria ser uma continuação da história de seu pai. Não queria ser um mártir do Rock And Roll. Queria apenas ser lembrado por sua música. Ironicamente, começou a chamar a atenção num show-tributo dedicado ao pai, que tocou junto com Gary Lucas, que já tinha tocado com a banda Captain Beefheart. Após alguns ensaios, Gary o convidou para integrar sua banda Gods And Monsters como vocalista. Apesar de ter adorado a idéia, pouco tempo depois Jeff deixava o grupo para seguir carreira solo. Reiniciou do zero no ano seguinte em New York em um bar chamado Sin-é. Munido de voz e guitarra, as performances dele eram tão arrebatadoras que no mesmo ano de 1992, assinava com a Columbia Records.

O resultado foi seu primeiro e último álbum, "Grace". Uma obra prima com todas as letras, do início ao fim, sem tirar nem pôr. Poucas vezes a alma de uma pessoa, todas as suas imperfeições,tristezas e anseios, esteve tão exposta em apenas um disco. Jeffrey exalava suas influências por todos os poros - folk, rythm and blues, soul music, hard rock, compondo um disco completo e variadíssimo, com letras fortes e pessoais, assim como nos bons e setentistas tempos de Neil Young e Nick Drake. Acompanhando Jeff, estavam os músicos Mick Grondahl no baixo, Mat Johnson na bateria e Michael Tige na segunda guitarra.

"Mojo Pin" é iniciada por dedilhados lentos, uma marcação sutil do baixo, e Jeff rompendo em um falsete. Começando a cantar em um tom doce, a música vai crescendo junto com a sua voz. A guitarra cresce, a bateria imprime maior ritmo na cançao, e Buckley canta sobre um amor doído, que se retornasse, ele não precisaria arranjar outras distrações para tentar satisfazê-lo. "Eu não quero chorar por você/Eu não quero saber, eu estou cego e torturado/Os cavalos brancos cavalgam/As memórias pegam fogo, o ritmo cai devagar...". Se aproximando do final, a música explode em intensidade, a bateria marcha, as guitarras pesam, e Jeff grita de uma forma inacreditável mais de uma vez. Um daqueles gritos tão agonizantes e desesperados que da primeira vez deixam o ouvinte perplexo.

Com início intimista e uma bateria entrando como um trovão, a música título "Grace" reparte melodias lindíssimas e a voz no limite do vocalista, cantando os versos de forma tensa para descambar em um doce e irônico refrão que diz para esperar no refrão. E você não consegue deixar de prestar atenção na música. É tudo forte demais. Jeff canta sobre o que artistas compõem poucas vezes na vida - a morte. "E eu sinto chamarem meu nome/Tão fácil de saber e esquecer com esse beijo/Eu não tenho medo de ir, mas vou tão devagar...", canta com toda a força dos pulmões.

"Last Goodbye", entrando em compassos lentos e acordes corajosos, é guiada pela levada de bateria, que abre espaço para Jeff emitir um triste trado sobre o fim de um relacionamento. "Sim, esse é o nosso último abraço/Devo eu sonhar e ver sempre o seu rosto?/Por que a gente não consegue ultrapassar esse muro?/Bem, talvez seja por que eu nunca te conheci mesmo", expressa um dos versos mais fortes. A música então já se tornou de beleza dura e peso doído. E falsetes e acordes de piano denunciam que tudo acabou.

Jeff te empurra no sofá cantando desde o início a jazzy "Lilac Wine", standart famoso na voz de Nina Simone que Buckley fez questão de dar sua versão dos fatos. Um doce e polido diamante musical sobre um amor inebriante feito vinho. Ele clama pelo seu amor, querendo encontrá-lo de qualquer jeito. Em certos momentos, Jeff faz tremer nas bases. Especialmente no final capaz de rachar o mais duro coração de pedra, "Vinho lilás, eu não me sinto pronto para o seu amor...".

"So Real" com cordas contidas e em tom de alerta, é uma música sobre o medo que as pessoas têm de amar. Apesar de afirmar que todos os momentos que passou com a pessoa que ama foram reais demais para ele, afirma "Eu te amo, mas eu tenho medo te amar/Eu tenho medo de te amar". Assim como nas duas músicas anteriores, as barreiras que as pessoas não conseguem romper para conseguir encontrar a felicidade real. Um solo de guitarra distorcido destoando do resto da música soa como a maior das insatisfações sendo posta pra fora em notas vigorosas e revoltadas.

Entra então uma música que é impossível ficar imparcial ao escrever sobre. "Hallelujah", regravação de seu ídolo Leonard Cohen, é um desafio para a capacidade descritiva de qualquer um. Iniciada por tristes melodias e um baixo ressoando, é simplesmente música demais para ser transformada em verbo. A devoção e o abandono com que Jeff Buckley se entrega ao tema é de chocar. De chocar com tanta doçura, com tanta tristeza, e a voz de Buckley soando cada vez mais e mais forte, mas sem nunca perder a beleza, opondo o sagrado e o humano, descrevendo um amor destrutivo, em versos como "O amor não é uma marcha de vitória/É um frio e sofrido Aleluia" e "Talvez haja um Deus lá em cima/E tudo que eu já aprendi sobre o amor/Era como atirar em alguém que tirou você". De ficar com os olhos marejados não importa quantas vezes escutemos: sempre continuará uma das canções mais lindas e melancólicas já compostas.

"Lover, You Should've Come Over" tem um início soturno, que logo se transforma em uma canção cadenciada de mais de seis minutos. Novamente volta o tema de um amor que consome o eu-lírico totalmente, deixando-o consumir, deixando ele solitário e obsessivo, em busca de uma chance de redenção. De início simples, a música vai crescendo em todos os quesitos, mas principalmente na interpretação de Jeff, que só para variar, arrasa, dizendo que nunca é tarde para voltar atrás, e sentimos todo o cansaço de se levar uma vida como essa exposto em sua voz lamentada e seus falsetes lancinantes.

A terceira regravação é "Corpus Christi Carol" de Benjamin Britten que, em termos técnicos, talvez seja a melhor performance vocal de Buckley. Cantando quase como uma soprano, alcançando um clima quase religioso, de deixar em transe. Apenas voz e cordas compondo a música mais curta da bolacha. Uma pueril admiração pela casta personagem do título, acompanhado de um refrão onomatopéico.

"Eternal Life" era o que mais podia se aproximar do mercado da época, já que Jeff não era pesado o suficiente para as rádios rock e era alternativo demais para mídias mais pop. A canção é um hard rock inserido na sonoridade dos anos noventa, fazendo soar quase como um grunge, com suas guitarras pesadas e sua cozinha sempre impondo um ritmo intenso na canção. Na canção, Buckley vê tudo corrompido e anseia por salvação, que para ele, nada mais é aceitar que a vida é assim e temos que aprender a lidar com ela, por mais difícil que isso seja. Como diz com urgência no verso "Não há tempo para ódio, apenas para questionar/O que é o amor?/Onde está a felicidade?/O que é uma vida?/Onde está a paz?/Quando eu vou encontrar a força para me trazer alívio?". E no final, a canção volta a ganhar belas melodias acompanhando seu ritmo pesado. Um dos grandes talentos de Jeff: saber encontrar beleza até mesmo na agressividade.

E, encerrando, "Dream Brother" vem em cordas hipnóticas, uma das mais intimistas de todo o conjunto, com uma pegada forte de bateria, um refrão chamativo e momentos instrumentais simplesmenet viajantes, e Jeff sonha que ele só quer sentir-se seguro nos braços da pessoa, enquanto a mesma está com outro. Mas o mundo continuará girando para sempre, diz Buckley, e pelo jeito, não há mais nada a se fazer.

Jeff vendeu cerca de 300.000 cópias deste disco, algo que as gravadoras consideraram uma repercussão muito fraca, apesar do nome do cantor estar cada vez mais em voga. Fato este que o desagradou e o fez voltar ao formato de voz e guitarra e tocar para pequenas platéias de bares americanos. Underground e mainstream: o Hamletismo dos anos noventa que ergueu tantos, derrubou tantos outros, e fez com que tantos nomes como este que vos é apresentado não ganhasse maior reconhecimento.

Morto em 29 de maio de 1997 por afogamento, Jeff só confirmou a teoria da chama. Muitas pessoas questionam até hoje porque o mundo é tão injusto de nos tirar um cantor tão único assim. Tão individual, tão universal, tão sensível... Que sabia falar sobre morte, amor, vida, tristeza, sem cair no clichê. Apenas sendo honesto. Buckley angariou uma legião de fãs famosos, entre eles lendas do rock como Bob Dylan, Robert Plant, Jimmy Page, Lou Reed, David Bowie e Patti Smith, contemporâneos como Chris Cornell, Björk e PJ Harvey, fãs exóticos como a banda de Doom Metal Katatonia e o ícone do rock brasileiro Paulinho Moska, e influenciou nomes como Radiohead, Muse e Coldplay.

E o leitor me pergunta: é possível que alguém seja assim tão bom? É possível que um disco converse com a gente não só pela letra, mas pela música também? Ele era essa alma que não cabia no corpo? Nem tudo na música está perdido depois do final dos anos setenta?

Deixo Jeff responder por mim.

sexta-feira, dezembro 14, 2007

The Cure "Three Imaginary Boys - Deluxe"


Quando Chris Parry (CP) contratou os The Cure para a sua Fiction Records, queria um trio à imagem dos The Jam. E assim foi gravado este "Three Imaginary Boys" (3IB).
Corria então o ano de 1979. O punk ia rebentando os últimos foguetes e consequentes motins, os Joy Division e os Siouxsie And The Banshees tinham lançado as suas primeiras edições no ano transacto e a vida em Inglaterra não ia famosa. Portugal nem para férias servia.
Os The Cure eram três rapazes saídos de Crawley que tinham lançado um polémico single "Killing an Arab" (conotações racistas com o título da música que estavam totalmente erradas) e que rapidamente entraram em estúdio para gravar este disco. Robert Smith (RS) era o líder e compositor de serviço e nesta fase apoiava-se numa estrutura de poucos acordes, refrão orelhudo e pouco mais num espaço de três minutos. Imagine-se uns Beatles nos seus primeiros tempos, mas com uma atitude de subúrbio. Mas o ponto que distingue este 3IB é a produção do já referido CP. O som que ele queria para a banda, claramente não era o que a banda queria, tal como podemos comprovar no seguinte "Seventeen Seconds", este já com produção de RS e Mike Hedges. Daí que este 3IB seja uma falsa partida para uma carreira já com uma respeitosa idade e bastantes pontos altos.
Este é portanto um disco sem os famosos singles dos The Cure, ainda em fase pré-depressão, pré-ácido, pré-maquilhagem, pré-carradasdeLSD e pré-concertosdeestádio.
Uma nota para destacar alguns aspectos curiosos. No design deste disco, na primeira edição, as músicas eram identificadas apenas por símbolos (ver fotografia em baixo) que correspondiam a fotografias na contra-capa.

Não haviam igualmente fotografias da banda e a capa, que podem ver no topo, eram três objectos que supostamente corresponderiam aos elementos da banda. Era a aura de mistério que CP queria para a banda. Olhando agora para trás, talvez tenha resultado.
Chegados a 2005, vem esta re-edição, que para além do som remasterizado, inclui também um disco de raridades. Ora, tendo em conta que tanto a produção estava deslocada, como a composição dos temas era ainda incipiente, raridades não melhoram muito o aspecto geral desta edição. Servem essencialmente para os fãs acompanharem algumas demos, out takes, faixas mais ou menos perdidas (sim, está por aqui o "Boys Don´t Cry" original) e versões ao vivo.
Portanto e para finalizar, uma edição sobretudo para fãs e em especial para aqueles com o disco de vinil já g
asto.

terça-feira, dezembro 11, 2007

Thurston Moore - Trees Outisde The Academy


Thurston Joseph Moore, nascido na Florida, ficou conhecido quando mudou-se para Nova Iorque, lugar onde foi para estudar e acabou conhecendo o também guitarristaLee Ranaldo, e Kim Gordon (sua futura esposa) e se envolvendo no emergente movimento No Wave, dicípulos de Glenn Branca, e acabaram formando o Sonic Youth, em 81.
Thurston é guitarrista, vocalista e um dos letrista da banda, assim como é um dos líderes. Ao lado de Lee Ranaldo, são considerados um dos maiores guitarristas da cena de rock alternativo e principalmente de música barulhenta (noise), com seus instrumentos modificados e técnicas bizarras para produzir sons mais estranhos ainda, tocando com baquetas, chaves de fenda e todo o tipo de utencílio pra produzir uma boa barulheira.
O cara sempre teve em contato com outros artistas, fazendo projetos paralelos, participações especiais, diretor de vídeo clipe, produtor musical e tal (figura tipo Mike Patton ou Dave Grohl). Em 1995 lançou o primeiro disco solo, chamado Psychic Hearts, no mesmo ano que sua banda lançava Washing Machine. Agora, doze anos depois do primeiro disco, o cara voltou a gravar, seu segundo disco, chamado Trees Outside The Academy, que foi lançado pelo seu selo Ecstatic Peace (outra ocupação) e gravado no estúdio de seu amigo J. Mascis, do Dinosaur Jr., banda qual também lançou cd esse ano.
Para a gravação do cd, Thurston contou com a presença de Pete Shelley na bateria, que é seu companheiro de Sonic Youth e Samara Lubelski no violino (ambos estão em turnê da divulgação do disco), assim como algumas participações de Mascis nas guitarras (claramente na música que deu o nome para o disco). Ao contrário do som de sua banda, seu projeto solo se baseia muito mais na textura do seu violão, plugado em um rock experimental com flertes com o pop e folk, resultando um som orgânico, reflexivo e hipnótico, principalmente, mas sem nunca deixar o barulho de lado. Como normalmente os discos do Sonic Youth carregam músicas inspiradas em artistas, esse não podia ser diferente, assim como foi seu primeiro disco: A música que dá o nome ao disco, "Trees Outside The Academy", musica dotada de um sentimento sobre o suicída Ian Curtis, do Joy Division, que recentimente recebeu um filme biográfico e a outra é a balada "Honest James", sobre James Brown, numa performance arrebatadora do dueto Thurston Moore - Christina Carter.