Rockabilly Psicotico, garage bands, punk rock, bandas desconhecidas...

domingo, maio 27, 2007

Carne, café e espírito selvagem

Hasil Adskins


Hasil “The Haze” Adkins viveu até o dia 28 de abril em um trailer ao lado da mesma casa que nasceu e nunca abriu mão de tocar uma música apaixonada, agressiva e verdadeira. A causa de sua morte permanece desconhecida, mas ele deixou órfãos grupos como os Cramps, Demolition Doll Rods e Jon Spencer Blues Explosion. George Araújo desvenda o universo demente e fascinante deste intrigante senhor que mal sabia a sua idade.

A história é velha e todos já devem ter conhecido alguém na mesma situação: perdido em um quarto ou em um interior qualquer dos quintos dos infernos, está simplesmente uma pessoa genial e sem instrução alguma fazendo coisas inimagináveis a partir do nada. Essa pessoa improvisa, contorce e distorce o senso comum justamente por voltar ao básico da maneira mais boba possível. É aí que reside a sua genialidade.

Hasil Adkins foi essa pessoa. Nascido e criado nas colinas americanas de Madison, West Virginia, este senhor que mal sabia a própria idade [afirmava ter 67 anos, aproximadamente], condenou todas as almas que escutaram sua música à inquietação eterna. Compondo desde a década de 1950, sabia de cor mais de nove mil canções [apenas 25% eram covers!] e executava todas elas com fúria e paixão nunca vista antes no pretensioso showbiz americano.

Enquanto caçava galinhas e animais silvestres, Hasil se divertia em inventar as mais absurdas histórias envolvendo sexo, decapitação, danças esquisitas e órgãos governamentais. Todas essas histórias aliadas aos hormônios em fúria e rock’n’roll clássico transformaram-no em uma nervosa banda-de-um-homem-só – ele cantava, tocava violão, gaita e bateria simultaneamente.

Adkins traduziu sua realidade em música. Gemia e assobiava e rosnava até para quem não quisesse ouvir. Ele aparentemente não vivenciava as coisas com uma pessoa comum e conseguia partir da mais descabida alegria para um imenso mar azul e triste – isso gritava dentro dele. Seu grito foi tão forte que causou a metamorfose do manso rockabilly em um peçonhento e ultradivertido psychobilly, mas para isso foi necessário um tempo.

Foram quase duas décadas desde o lançamento de “My Baby Loves Me”, seu primeiro single, para conseguir algum reconhecimento. Nem mesmo Richard Nixon, presidente americano na época, escapou de receber algumas fitas. A obscuridade total durou até os Cramps gravarem uma versão para “She Said”. Essa música catapultou o adulto Hasil à condição de cult e fez com que um single feito em 1964 fosse confundido como uma produção do início dos anos 80. Na velha casa da colina, porém, nada mudou e Adkins ficava alheio ao que se passava. Foi preciso que dois fãs criassem um selo para gravar seu primeiro álbum.

Nasce um selvagem
The Wild Man foi gravado em 1984 e lançado dois anos depois pela Norton Records. O álbum traz baladas sangrentas como “Turn Off a Memory” e nervos expostos do naipe de “Chicken Flop”. Provavelmente o maior problema desse disco para o grande público era a execução das músicas. Levando-se em consideração que sua carreira até então tinha sido marcada por singles mal gravados [além de viciado em café, vodca e carne crua, Hasil Adkins tinha o péssimo hábito de não cuidar de seus registros originais], comercialmente ele fora um fracasso. Mas a pedra-fundamental havia sido lançada. Partindo deste ponto, Billy Miller e Mirian Linna [primeira baterista dos Cramps e co-fundadora da Norton] selecionaram diversas músicas compostas pelo Selvagem entre 1961 e 1976 para transformar em bolachas.

Então a história mostrou mais uma vez que é cíclica. Tal qual um certo Velvet Underground, poucos compraram os discos de Hasil, mas todos que o fizeram montaram uma banda. Daí para frente, as coisas foram acontecendo de tal maneira que ele abriu um show do Public Image Limited em Nova York, ainda em 1986. Os dados sobre sua discografia divergem, mas são creditados a ele 15 álbuns, 23 singles e dois EPs.

Sua selvageria e tristeza singraram os mares e invadiram corpos de jovens espalhados por todo o globo. Na Europa, pessoas que figuram o selo übercool Voodoo Rhythm realizaram um festival apenas com nadas-de-um-integrante-só. Tal festival contou com a presença do próprio Hasil Adkins mais Margaret Doll Rod, Rev. Beatman e DM Bob, entre outros.

quarta-feira, maio 23, 2007

Billy Childish é um dos maiores outsiders do rock ingles desde o início dos anos 80.
Em 1983 ele e sua banda na época o Milkshakes abriu para ninguém menos do que o REI da guitarra surf Link Wray, pois eles eram uma das bandas de abertura do grande guitarrista falecido em 2005.
Esse show aconteceu no Electric Ballroom em Candem Town/Londres, essa é uma das mais modestas casas de shows inglesas, mas por alí já tocou quase todo mundo de 1980 até hoje.
No Electric Ballroom nos finais de semana durante o dia eles usam o espaço pras feiras de discos e também para o mercado de Camdem aos sábados e domingos.
Tem um palco enorme ao fundo e uma pista que acomoda umas 2000 pessoas, não tem o requinte e a arquiteura de uma Brixton Academy, de um Astoria ou do Shepherds Bush Empire, mas a disposição do local é perfeita pra shows.
Nessa noite de Link Wray, a banda de abertura era uma banda de rock and roll fifities chamada The Pirates.
A banda fez sua apresentação bem performática às vezes lembrando o Sha-Na-Na e em seguida entrariam os Milkshakes de Billy Childish.
Ao lado da pista tinham armado um pequeno palco cheio de bixigas de aniversário e alguma aparelhagem.
Pense bem os Milkshakes nesse palquinho improvisado, pois eles poderiam muito bem tocar no palco principal, pois a banda acabava de lançar seu segundo álbum "14 Rhythm & Beat Greats" e toda critica cobriu o disco de elogios.
Mas, foi aí que entendi a intenção do som dos Milkshkes "garagem" nos seus mínimos detalhes.
O som era sujo, os amplificadores eram antigos tudo vintage, e a voz de Billy estava conectada a um velho amplificador de valvulas que transmitiam pra umas caixinhas de voz estouradas e distorcidas.
Num primeiro todos devem ter ficado decepcionados com a qualidade tecnica do som, pois os esperava no palco principal com toda aquela parafernália de luz e som.
Agora a originalidade e a coisa autentica do som sixties daquele momento foi impagável, parecia que eu tinha voltado no tempo e estava vendo alguma banda da chamada "British Invasion" na decada de 60.
O show de Link Wray foi espetacular, mas o brilho dos Milkshakes ofuscou o brilho das demais bandas da noite.
Billy Childish passou a colecionar bandas, a partir dos Milkshakes vieram The Headcoats, Thee Might Ceasers,Delmonas,The Natural Born Lovers e Buff Medways.
Além disso fez uma série de albuns em carreira solo, lançou livros de poesia, foi editor de fanzine,é critico de música e claro guitarrista, cantor e compositor que sofre por incrível que pareça de dislexia cronica, pode???
Diante de tudo isso Billy Childish só poderia estar na lista dos meus heróis do rock.
A cada cinco anos mais ou menos Billy Childish muda de banda e cria algum projeto novo.
Em 2006 ele terminou com a garageira Buff Medways e montou o trio Wild Billy Childish & The Musicians of The British Empire e lançou um single com as músicas "Punk Rock At The British Legion Hall" e "Joe Strummers Grave"(esta última uma homengem ao falecido ex-Clash Joe Strummer).

Em abril de 2007 ( mês passado ) saiu no Reino Unido o álbum de estréia da banda, apesar do titulo e das referencias das músicas o som da nova banda de Billy Childish faz aquele mesmo som das bandas de garagem dos anos sessenta, essas são as verdadeiras raízes do punk, que Billy Childish se refere em suas canções.
Trabalhando intencionalmente com aquela mesma sonoridade de 1982 no segundo álbum dos Milkshakes, Billy Childish continua sendo um dos músicos mais originais e criativos há mais de 25 anos.

sábado, maio 19, 2007

Pin Ups

Início dos anos 90. Sem o menor vínculo com o que era produzido no país, sem os benefícios da Internet, cantando em inglês e virando as costas para o mercado, guitar bands pipocaram pelo Brasil. Tanto pelo pioneirismo quanto pela qualidade, o Pin Ups tornou-se referência para esta primeira geração de bandas indies surgidas por aqui. Em constante sintonia com o que era produzido no exterior, os paulistanos deixaram uma respeitável discografia que deu à banda um status de intocável no underground nacional.

Formado em 1988, o Pin Ups é o mito do rock alternativo brasileiro. Quando os primeiros discos da cena britânica chegaram ao Brasil, a banda já era assídua nos palcos do Espaço Retrô – a casa mais cult de São Paulo, administrada pelo boa praça Roberto. Porém, a história começa um pouco antes.

Em 1987, Zé Antônio e Luís Gustavo ensaiaram com duas garotas, mas desistiram porque elas tocavam muito mal. Até então denominados Bela Molnar - referência à uma personagem do filme "Estranhos no Paraíso", de Jim Jarmush - decidiram testar alguns amigos até que encontraram Marquinhos, o quinto baterista a ensaiar com a dupla. Como um trio e rebatizados como Pin Ups, tocaram pelos buracos de São Paulo, até assinarem um contrato com a Stilleto, graças à ajuda do amigo Thomas Pappon, do Fellini.

A sonoridade da banda com o nome inspirado num disco de David Bowie, destoava de tudo o que era feito na época no Brasil e a sintonia com o que havia de mais moderno na Inglaterra e nos Estados Unidos mostrava uma banda de personalidade não só nos palcos, como no estúdio.

Apesar de várias referências saltarem dos sulcos do vinil e da capa do primeiro álbum, "Time Will Burn" (1990) foi o marco inicial de uma cena que já criou gerações de bandas cantando em inglês. Na capa, o trio formado por Zé Antônio (guitarra), Marquinhos (bateria) e Luís Gustavo (vocal e baixo) apresentava um visual típico de bandas inglesas que assolariam o Brasil anos depois.

A banda terminou em 2000. Esboçaram um retorno quando abriram shows do Mudhoney e, mais recentemente, do Pixies no Brasil. Depois da criticada apresentação no Curitiba Pop Festival, uma nova reunião é bastante improvável. Talvez você nunca tenha escutado nada deles, mas com certeza conhece alguma banda que tenha um ex-Pin Ups em sua formação. Ex-integrantes da banda tocam ou já tocaram no Garage Fuzz, Thee Butchers' Orchestra, Forgotten Boys, Biggs, Hats, Killing Chainsaw, Lava, Dominatrix...

Discografia Comentada:

Time Will Burn (Stiletto, 1990)
A estréia é calcada na estética shoegazer de bandas como Jesus and Mary Chain e My Bloody Valentine, vocais sussurrados e distorção comandam o disco. Mas não espere encontrar aqui os dedilhados de Just Like Honey ou os vocais dóceis de When You Sleep, o Pin Ups remete aos momentos mais pesados e soturnos destas bandas. O EP Feed Me With Your Kiss, do MBV, e as músicas In a Hole e Fall, ambas do J&MC, são ótimas para contextualizar o debute dos paulistanos. Semelhanças com o Sonic Youth também são perceptíveis, principalmente com a fase Evol dos nova-iorquinos.

Mesmo inspirado no lado mais sujo do shoegaze, Time Will Burn é um disco dançante. Graças ao groove da eficiente cozinha, o Pin Ups também podia ser ouvido nas pistas.


Gash (A Mellow Project by Pin Ups) (Zoyd, 1991)
Por mais paradoxal que possa parecer, várias bandas shoegazers se arriscaram em discos quase acústicos. Os irmãos Reid limaram as microfonias, apostaram em baladas e tangenciaram a perfeição em Darklands. O Pin Ups fez bonito com Gash, um disco que insiste em não soar datado. Dave Grohl é fã deste álbum. Anos depois de sua vinda ao Brasil com o Nirvana, ele disse, em uma entrevista, que o disco havia se tornado um dos seus favoritos.

Na primeira audição é comum conferir se a bolacha está na rotação certa. Mas o som é assim mesmo: viajado, chapante. Capaz de agradar aos fãs mais exigentes de Spacemen 3 e Telescopes, Gash triunfa ao trazer baladas introspectivas e melancólicas sem perder o groove da estréia. Fechando o disco, a recém-ingressa baixista Alê canta sua primeira música na banda, uma versão de A Day in a Life no melhor estilo Beatles meets Sonic Youth.


Scrabby? (Devil Discos,1992)
Produzido por João Gordo, Scrabby? traz de volta as guitarras no talo. O vocal agora é mais gritado. Em sintonia com o grunge, este terceiro álbum afasta a sonoridade indie britâica do início da carreira e remete aos momentos mais pesados dos Smashing Pumpkins. Neste disco, a banda regravou um hit da cena independente da época, Evisceration, dos piracicabanos do Killing Chainsaw, que por sua vez arrancaram elogios de Kurt Cobain em sua passagem pelo Brasil.

Jodie Foster (Devil Discos, 1995)
Jodie Foster marca o início da Trilogia Cinematográfica, o abandono do LPs e a entrada de uma guitarra-base na formação da banda. O som é punk e direto, poucas faixas mantêm a pegada mais arrastada de Scrabby?. Veloz e barulhento, é o disco mais indicado para fãs de Hüsker Dü. Ainda é possível encontrar resquícios do passado shoegazer, como em In a Hole, cover do J&MC, e Witkin, nitidamente inspirada em Sunny Sundae Smile, do MBV.

Lee Marvin (Spicy Records, 1997)
Mais coeso e melódico que o anterior, Lee Marvim escancara a influência dos americanos do Superchunk. É neste disco que Alê assume definitivamente os vocais. Com guitarras mais limpas e vocais suaves, Lee Marvin é o disco mais acessível da banda, cheio de hits em potencial. Como de praxe, o álbum traz ótimos covers: Frontwards, do Pavement, e Under Canvas Under Wraps, do Delgados.


Bruce Lee (Short Records, 1999)
A despedida da têm, a princípio, quatro faixas. To All Our Friends e Growing Up poderiam estar tanto em Lee Marvin quanto em um disco do Teenage Fanclub, os versos da primeira não deixam dúvidas de que o Pin Ups havia chegado ao fim: “the time that we have spent / together in our band / it was the most fun we ever had / we know it's hard to understand / we know, we know, we know it is hard / we know, we know, we know it's all right ...”. Depois de uma vinheta que lembra as viagens do Gash, vem a melhor parte do CD. Com 35 minutos, 12.12.1998 é a integra de um show acústico realizado nesta data. No repertório, clássicos do Pin Ups tocados em ritmo um pouco mais lento e covers de Superchunk, Beatles e até Kraftwerk.

quinta-feira, maio 17, 2007




A alguns posts atrás escrevi uma pequena biografia do guitarrista Johnny Thunders. Agora trago para vocês um pequeno texto sobre o disco Johnny Thunders And The Heartbreakers - L.A.M.F, espero que gostem ...

Se na década de 60 a mídia criava slogans para os Rolling Stones, perguntando aos conservadores "você deixaria a sua filha casar com um rolling stone?", no final dos anos 70 não havia mais propaganda cabível para promover a gangue, quer dizer, a banda de Johnny Thunders. Mas suas faces decadentes e maltrapilhas pareciam querer questionar: "você teria ao menos coragem de falar com um heartbreaker?".

Em 1975, após lançar dois registros mais do que obrigatórios e influentes com o New York Dolls, Thunders abandonou a banda junto com o baterista Jerry Nolan, decretando o primeiro fim da banda. Junto com o famoso (ou famigerado) Richad Hell no baixo, eles fundaram o Heartbreakers. Antes mesmo de lançarem algum disco, a banda já era por si só tremendamente influente. Mas quando todos achavam que um supergrupo do punk rock estava se formando, Richard Hell deu o fora e no seu lugar foi chamado Billy Rath, e a formação foi completada com a segunda guitarra de Walter Lure. Logo, assinaram com a Track Records e foram chamados para ir para a Inglaterra abrir show dos Sex Pistols e do The Damned. Pronto. Johnny, Jerry, Billy e Walter quebravam corações, injetavam rios de heroína veias adentro, arranjavam encrenca por muito pouco e levavam muitas groupies para a cama. Por isso, não há sigla nem nome de disco que designe melhor uma banda que resolve adotar esse nome. "L.A.M.F.", ou "Like A MotherFucker". Verdadeiros filhos de meretrizes, "lixo branco", alguns dos muitos garotos esquecidos pelo mundo.

Áspero, nem um puco sutil, gritado, uma verdadeira máquina de riffs dos anos 50 tocados da forma mais suja e agressiva possível, refletindo o próprio cotidiano dentro da banda, que muitas vezes só funcionava com o empresário pressionando, e muitas vezes, chegando até mesmo a sair no braço com alguns dos integrantes da banda. Mas os Heartbreakers deixaram esta primeira e única marca em 1977. Tudo bem que não é uma marca que muitos gostam de ver, como uma mancha seca de sangue na parede, mas é uma marca que persiste, e que por mais que você tente repudiar ou ignorar, ela continua lá, te incomodando.

E você não precisará de muito esforço para manter isso em mente, pois assim que começam os acordes decadentes de "Born To Lose" e os vocais cuspidos de Thunders gritando "essa cidade é tão fria/e eu sou tão lerdo" e "viver numa selva não é tão difícil/mas viver na cidade vai comer o seu coração", e a banda toda gritando no refrão "Nascido para perder, nascido para perder, baby, eu nasci para perder", você começa a ter noção do buraco onde caiu.. Autêntico rock de garagem, ou, como a banda sugere na capa, de um beco sem saída.

Salve-se quem puder. Menos de dois minutos e meio de pancadaria caótica, "Baby Talk" tem uma letra curta, direta e safada berrada a plenos pulmões por Johnny. Nem um pouco poética ou polida, tanto sonoramente quanto liricamente, apenas aquilo que o pessoal da geração vazia sabia fazer de melhor: barulheira agressiva e rude, sem maiores preocupações de quem estaria amando ou odiando.

"All By Myself" tem um riff marcante e linhas vocais mais marcantes ainda. Mostra toda a herança rocker que o punk tinha, mas ao invés das mensagens de amor, Johnny Thunders dispara uma letra egoísta e pervertida. O solo aqui chega cortando aos ouvidos, um dos poucos momentos que o disco se dá ao luxo de tentar parecer ter algum esmero com suas canções, mas quando o vocal volta a gritar "All by myself/Not everybody else", essa ligeira perspectiva é estragada. Malditos junkies...

A próxima é "I Wanna Be Loved", mas não caia nesses papos de junkie, o que eles tem de legais tem de mentirosos... Prova disso é que apesar dos muitos "eu quero ser amado/ser amado por você", Johnny ainda declara "Você não pode mudar minha mente/Você não pode mudar os tempos/Você pode fazer o que você quiser/É melhor você ler entre as linhas". Porradeira que dexaria o Who dos primórdios orgulhoso, tudo isso ancorado pelo vocal insolente e fanfarrão de Thunders.

Balada insatisfeita, ou "It's Not Enough". As guitarras aqui soam mais melódicas, demonstrando a influência que a surf music dos anos 60 tinha sobre o punk rock (influência esta muito notada também nos primeiros álbuns dos Ramones - claro, isso se os Ventures e os Beach Boys passassem uma temporada em inferninhos novaiorquinos...) sustentadas por um baixo bem presente. E veja só; ainda tem um belo solo. E Johnny segue, disparando: "Você pode me dar isso,/Você pode me dar aquilo/Ainda não será o suficiente".

A fúria volta, e em grande estilo; composta por Dee Dee Ramone e Richard Hell, mas de início recusada pelos Ramones por falar descaradamente sobre drogas, assunto sobre o qual a banda não queria falar sobre. Então restou a missão de Thunders berrar a ramônica "Chinese Rocks", sobre um passeio com Dee Dee pra comprar "pedras chinesas". E a banda ainda se esgoela no refrão, cantando "eu estou vivendo de pedras chinesas/tudo está na casa de penhor". Depois, Johnny reclama da casa estar caindo aos pedaços e de sua namorada chorando. Cara de pau é pouco. A sonzeira, então, nem se fala. Poucos porém abrasivos acordes, bateria esporrenta e um refrão fantástico, tanto na energia quanto na cara de pau.

"Get Off The Phone" é iniciada novamente por uma contagem e guitarras cortando o tímpano. Cuspindo a letra, Thunders descreve um relacionamento de longa data que enche o saco dele. No início, a mulher caía de amores por ele, mas agora vive caída ao lado do telefone. E a banda se esgoela gritando: "saia do telefone/não há ninguém em casa/então saia do telefone/porque eu não quero você". Ainda é detonado um solo mais afiado ainda. Um golpe que te atinge o tórax como uma faca.

Até as melodias são cafajestes em "Pirate Love". Ele diz pra uma garota ser do jeito que ele quer, e diz que tanto as garotas inocentes como as mais experientes estão dizendo não para ele. E ele diz no refrão, em meio a solos de guitarra estraçalhantes e o baixo que parece dar um mata-leão no ouvinte: "amor pirata/é o que eu estou procurando/amor pirata/eu nunca precisei tanto disso". A canção vai se esfacelando até acabar.

"One Track Mind" tem um dos riffs mais animais e selvagens que a década de 70 viu nascer. Junto com a bateria, parece que você é uma criancinha inocente sendo espancada por algum campeão do boxe da categoria peso-pesado. O solo é um gancho que faz cair de cara na lona para que você possa ouvir a banda berrar direto no seu ouvido "I GOT ONE TRACK MIND, I GOT ONE TRACK MIND". E melhor não reclamar, senão apanha mais.

Se não reclamar, também. Desrespeitando o título, "I Love You" chega aos nossos ouvidos como um trator de agressividade, e mesmo com a letra mais romântica que algum pobretão de New York conseguiria fazer, ele ainda canta "Eu te amo/Realmente amo/Não tem ninguém como você/Baby eu amo" do jeito mais berrado e maltrapilho possível. As garotas certinhas certamente acharam que era um bêbado tentando dar em cima dela; mas o famoso affair de Johnny, Sable Starr, provavelmente acreditou (claro, não por muito tempo, mas sabe como é, década de 70, New York, CBGB's, junkies...).

"Going Steady" tem o refrão simples, e uma estrutura com paradinhas e retomadas empolgantes. Sem muito segredo, o bom e velho rock and roll que ainda soa jovem e agressivo até os dias de hoje. A música transborda todas as características do Heartbreakers, mais um tiro certeiro entre os olhos. Desde a primeira música você já sentiu seu coração e sua alma sendo pisados e vandalizados, mas você ficou numa atitude "bate-que-eu-gosto", e como bons dominatrix que são, os Heartbreakers mui gentilmente atendem seus pedidos...

O golpe final é extremamente barulhento e recebe o nome de "Let Go", com a sonoridade e a letra mais alucinadas do álbum. As guitarras te deixam com joelhos, investindo com fúria e vigor monstruosos. Rock mal-educado como só Johnny sabe fazer do seu jeito todo especial. É um chamado para conhecer todos os extremos que o Rock pode te oferecer. E um dos últimos libelos punks de Thunders.

Johnny Thunders é uma figura que, sem dúvida, faz uma grande falta à música. O rock cafajeste, safado, barulhento, decadente e violento e batizado com óleo de peroba faz uma bruta falta no cenário de hoje em dia. Depois dos Dolls, Thunders deixava sua terceira aula definitiva de como fazer um disco de rock and roll genial precisando apenas de guitarra, baixo, bateria, microfone e um grupo de junkies que saibam como nos deixar estatelados no chão. E sem sentir nem pena nem remorso. L.A.F.M.

terça-feira, maio 15, 2007


Rock Argentino

Tão perto e ao mesmo tempo tão longe, essa é a nossa relação com a música feita em nossos vizinhos. Preconceito? Falta de conhecimento? Preguiça?

Para começar nós, brasileiros, não gostamos de ser chamados de latinos, soa pejorativo para as nossas cabecinhas, e latinos são só os que falam espanhol.

Aí junta-se o preconceito com a preguiça e temos a total falta de conhecimento sobre o que é lançado na Argentina, Chile, Colômbia, México, etc. E tem também o lance com as gravadoras que não querem correr riscos, se elas já não lançam as boas bandas brasileiras o que dirá as outras. E tem mais, com tanta banda no Brasil pra que nos preocupar com as de fora? Poderia ficar aqui enumerando mais e mais motivos para não nos ligarmos no que rola de interessante em nossos hermanos, mas acho que seria perda de tempo.

Mas olha lá uma velinha acesa no fim do túnel. Como existe um certo intercâmbio entre as bandas brasileiras e as de outros países, os fãs acabam procurando informações sobre essas bandas também e conseguem ter boas surpresas. Não é preciso citar que Fito Paez só ficou realmente conhecido por aqui graças aos trabalhos com o Paralamas, mas tem fã do Pato Fu indo atrás do trabalho do Aterciopelados, só porque estes foram comentados pela Fernanda Takai não sei onde. Pois é, é pouco ainda, mas já é um começo. Se nossos artistas conseguem entrar no mercado argentino, por exemplo, por que as bandas argentinas não entram aqui? Deveria ser uma via de mão dupla, mas não é.

Nos proximos posts estarei colocando bandas sulamericanas que valem a pena dar uma olhada e ter suas musicas baixadas ou seus cds comprados.

Bom, parando com a enrolação, vamos dar uma voltinha até Buenos Aires

Satan Dealers

Com seu segundo disco, The Brightest View, lançado a pouco tempo, o Satan Dealers é mais uma banda que pega a onda do rock dos anos 60, 70 e 80, coisas já citadas como New York Dools, Ramones, Stooges e MC5, e chega a lembrar o trabalho do Cramps com seu psycobilly tresloucado. Uma mistura de punk com hard-rock que parece estar fazendo a festa da molecada tanto aqui no Brasil como na Argentina. O chato é que pra falar do Satan Dealers vou acabar soando repetitivo, já que muito do que poderia comentar já foi feito mais acima com o Corazones Muertos e Sensacional Plasma. Rock largado, lerdo, a versão para Bette Davis Eyes, clássico dos anos 80, mostra bem isso. O que diferencia o Satan das outras é a constância em suas músicas, todas estão em um mesmo nível, não havendo alguma que você queira pular, diferente das duas outras bandas citadas onde algumas faixas soam descartáveis.


Uma certeza, se a banda fosse americana ou inglesa, já teria estourado por aqui, eles não devem nada a Kings of Leon, Yeah Yeah Yeahs e afins, pelo contrário, mandam muito melhor que essas coqueluches da imprensa mundial, e até brasileira. Faixas como They Try To Shooted But They Missed (o Cure em versão punk), Sometimes You Should Ask Yourself (outro Cure, a introdução lembra The Forest), Love Have Nails And Hurts (com um riff que deixaria o Slash babando) e How Hard It Is to Fix (Motorhead na cabeça) são faixas que apenas confirmam a afirmação que fiz acima.

quarta-feira, maio 09, 2007



Dead Boys - Young, Loud & Snotty - 1977



Jovens, barulhentos e imprestáveis. Eles são... os Dead Boys! Outra excelente banda vinda da cena punk do C.B.G.B. Originários de Cleveland, eles meio que pegaram o Joey Ramone como padrinho da banda. Conseguiram que Joey (que já era da casa) agendasse um show para eles no C.B.G.B. Logo em seguida, o proprietário do clube, Hilly Kristal, empresariou-os. Diz a lenda que Stiv Bators (o vocalista) foi o cara que passou pro Iggy Pop a manteiga de amendoim, no lendário show em que Iggy caminhou sobre as mãos da platéia (download Iggy Pop & The Stooges - TV Eye & 1970 51.3 MB) , mas nunca teremos como comprovar esta informação. Falando em Iggy Pop, era o ídolo de Stiv. Toda a performance de palco de Stiv era baseada em Iggy, mas isso não importa, pois o som deles era novo e além do mais, Iggy não estava em cena naquele momento, estava curtindo uma trip de veadagem com o David Bowie (trip esta que tirou Iggy Pop do período de auto-destruição pós-Stooges e que resultou em álbums clássicos, seja dito).

Este é o primeiro disco da banda, e é mais um clássico do Punk Rock. Músicas melódicas, um baixo muito empolgante, guitarras nervosas e um vocal alucinado de anfetamina! É impossível ouvir os Dead Boys e não sair assobiando a melodia mais tarde. É um daqueles sons que ficam na cabeça o dia inteiro, e tu só descansa a hora que tu ouve de novo, e bem alto! Todas as músicas são boas, mas dou destaque para 'Sonic Reducer', 'All This And More' (cujo refrão, I wanna be a dead boy, deu o nome à banda), 'What Love Is', 'Caught With The Meat In Your Mouth' (no melhor estilo Stooges), e 'I Need Lunch'. A "pretty knife" mencionada em 'What Love Is' diz respeito à uma faca 007 que Dee Dee Ramone deu para o Stiv, no segundo show que eles fizeram no C.B.G.B. Acho que foi uma maneira de Dee Dee dizer que gostava da banda. O disco tem ainda duas baladinhas: 'Not Anymore' e 'High Tension Wire', igualmente interessantes, pesadas e furiosas. O álbum termina com uma explosão em 'Down In Flames'. Contagiante, muito bom. Altamente recomendado. Nota 10.